A noite não estava frio, só um vento de fim de inverno soprava, e ele na janela fumando um cigarro, tentando achar o sono perdido no meio da fumaça. Tinha tomado chá preto, leite com café, a comida não descia, não cabia no estômago nada mais que a tristeza que inundava o coração. E transbordava pro corpo todo. Um cachorro correndo de um carro na avenida, mancando de uma colisão não evitada, outros correndo em sua direção. Ele se sentia aquele cachorro: aleijado, rejeitado, abandonado ao frio e à sua própria sorte. Sem dono, sem comida, sem casa, sem teto, no vento. Só que esse cachorro não fumava dois maços por dia. Duas da manhã, o sono não vinha, a cabeça pesava mais que o habitual, um turbilhão de idéias, pensamentos, mirabolantes que só, invadiam sua cabeça. Fazer como o cachorro, correr sem rumo, aceitar a dura realidade, sentar na calçada, esperar melhor sorte, alguém jogando uma salsicha pra ele, um afago na cabeça, um chute no pêlo encardido. Uma música boa ao fundo, uma guitarra folk arranhando acordes bonitos, melhor que um hardcore, mais doce que pudim de leite condensado... Um bando de jovens falando que viver a vida é correr e arriscar, “be fast”, lembrava Led... E o cachorro?! E a velocidade?! E o sono? Chegando de mansinho, sorrateiro, tirando o nexo das idéias, embaralhando o olhar, o propósito firme, o meio complicado, o fim longínquo... Organizar o pensamento, pensar objetivamente, tentar de novo, e de novo, até conseguir, ele não iria desistir nunca, era um guerreiro, não desiste porque é teimoso, sabia que era inevitável que iria conseguir, talvez demorasse mais que agüentava, mas iria..
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